A Parashá Vayerá inicia-se com a incrível demonstração de bondade por Avraham (Abraão), àqueles que ele pensa serem três homens, mas que na verdade são anjos enviados por D'us, pesar de seu extremo desconforto pelo recente brit milá, circuncisão.
Os anjos entregam sua mensagem, declarando que Sara milagrosamente dará à luz a seu primeiro filho no prazo de um ano, com a idade de 90 anos (o próprio Avraham teria cem anos). Em seguida, eles seguem para a cidade de Sodoma. D'us informa a Avraham que as cidades de Sodoma e Gomorra serão destruídas por causa da perversidade, e Avraham responde com uma longa prece e dialoga com D'us pedindo pelo salvamento das cidades.
Incapaz de encontrar dez cidadãos íntegros, D'us começa a destruir as cidades, mas não antes que os anjos salvem o sobrinho de Avraham, Lot e sua família, da destruição. Acreditando que o mundo inteiro havia sido destruído, as duas filhas de Lot embebedam o pai, para que ambas possam ficar grávidas dele, e cada uma acaba tendo um filho.
Sara é raptada por Avimelech, o rei de G'rar, que não havia percebido que ela era casada. D'us reage castigando-o com uma peste, que o impede de tocá-la, e informa Avimelech que Sara é casada, quando então é imediatamente libertada.
Sara concebe e dá à Luz Yitschac (Isaac), e Avraham faz uma grande comemoração. Sara vê Ishmael (o filho de Avraham com Hagar) como uma ameaça ao bem-estar espiritual de seu próprio filho. Relutante a princípio, Avraham segue a ordem de D'us, de dar ouvidos à esposa, expulsando Ishmael e Hagar de sua casa. Com Ishmael a ponto de morrer de sede no deserto, D'us escuta seus gritos e faz com que Hagar encontre um poço de água, e com isso o jovem é salvo.
Avraham assina um pacto com Avimelech na cidade de Be'er Sheva, e vivem em paz por muitos anos. A porção da Torá conclui com a akeidá, o altar, o décimo e último teste de Avraham, no qual ele demonstra sua boa vontade em aquiescer à ordem do Criador, de oferecer seu amado filho Yitschac em sacrifício.
Mensagem da Parashá
Você está recostado em sua poltrona, relaxado e envolvido num excelente livro, bebericando um copo de limonada gelada. Apreciando totalmente este descanso muito valorizado, é subitamente interrompido pelo som do telefone. Hesitante, pega o receptor para ouvir a voz de seu amigo, David. Ele está se mudando hoje e precisa de ajuda para carregar algumas caixas. Não desejando perturbar seu tempo de folga com nenhuma espécie de trabalho pesado, você responde quase mecanicamente que não, pois está ocupado agora. Desligando o telefone, volta à trama absorvente do livro.
A Torá, no início da porção desta semana, descreve com riqueza de detalhes como Avraham, quando visitado por três hóspedes, demonstrou enorme solicitude em servi-los e cuidar deles. Avraham "apressou-se a ir à tenda de Sara," para que ela pudesse preparar pão fresco, ele "correu até o rebanho" para preparar as melhores iguarias, e então "ficou de pé, perto deles, debaixo da árvore", enquanto comiam na sombra, assegurando-se de que cada necessidade lhes fosse fornecida (Bereshit 18:6-8).
Rabeinu Bachya destaca que, embora Avraham fosse um homem idoso e estivesse fraco por causa da circuncisão que fizera apenas três dias antes, e apesar de ter muitos servos que poderiam ter atendido os hóspedes, em sinal de respeito Avraham fez tudo sozinho, com grande zelo e entusiasmo.
Ao final da porção da Torá há uma outra situação, na qual Avraham demonstra seu caráter zeloso. Na manhã em que Avraham levantou-se para realizar a akeidá, o sacrifício, a Torá relata que "ele se levantou cedo" para cumprir a mitsvá. Nesta difícil situação, quando Avraham recebeu ordem de levar o filho amado, pelo qual esperara ansiosamente por tantos anos, como uma oferenda, poder-se-ia pensar que a última coisa que a pessoa faria fosse acordar cedo para embarcar nesta missão! Mesmo assim, vemos que Avraham o fez. Como é possível?
Uma vez mais, temos um exemplo da personificação de Avraham da qualidade de ser zeloso, rápido e entusiasta em cumprir as mitsvot, preceitos, de D'us. Avraham desenvolveu este traço a tal ponto que, mesmo nesta situação difícil e extremamente penosa, ainda foi capaz de superar o desejo natural de protelar, chegando mesmo a levantar-se cedo para fazer a vontade de D'us.
Isso nos ensina uma lição inacreditável, que justamente quando a situação é desconfortável, ainda temos a capacidade de cumprir uma mitsvá com zelo e entusiasmo, e especialmente quando a mitsvá não é tão difícil.
Há um conceito bem conhecido na dinâmica humana conhecido como inércia - tendência natural da pessoa de tentar permanecer tão inativa quanto possível. Esta tendência intensifica-se quando se trata de cumprir mitsvot, porque há um freio natural, a má inclinação, que fará todo o possível para impedir que a pessoa faça uma ação que lhe possibilitará uma recompensa no Mundo Vindouro. Com isto em mente, temos uma pergunta: Como a pessoa adquire a característica de Avraham? Como subrepuja sua indolência natural para atingir a grandeza?
Há duas maneiras de fazer isso: Rabi Moshê Chaim Luzzatto explica que podemos fazê-lo, concentrando-nos em todas as coisas que D'us realiza para nós, pois se pudermos reconhecer todo o bem que Ele nos concede, e as enormes maravilhas que realiza desde o dia em que nascemos até nossos últimos, sem dúvida nos apressaremos em fazer o possível para retribuir, com toda nossa capacidade, cumprindo a Torá e exaltando Seu nome.
A segunda maneira, diz Chafetz Chaim, é reconhecer a importância de cada minuto. Sabemos que cada palavra da Torá que a pessoa estuda é uma mitsvá por si mesma. Se a pessoa fala à velocidade normal, seriam aproximadamente duzentas palavras por minuto, portanto, se a pessoa fala sobre a Torá por um minuto, realiza duzentas mitsvot de uma só vez. Agora pense: se a pessoa estuda por quinze minutos, cumpre três mil mitsvot! Se aprender por uma hora, faz doze mil mitsvot! E se a pessoa estuda o dia inteiro? Que tal alguns dias? Todas as mitsvot vão se somando, e quanto mais mitsvot cumpre, mais recompensa recebe. Dentro de pouco tempo, terá a capacidade de cumprir milhões!
É através deste reconhecimento que adquirimos o desejo de utilizar cada momento da maneira mais completa, seja estudando Torá, ajudando o próximo. Porém, precisamos de uma presteza e zelo especiais para nos assegurar de que corremos para fazê-las, e ao mesmo tempo buscando a certeza de que são cumpridas adequadamente.
A idéia de valorizar cada momento foi explicada numa parábola por rabi Moshe Yitschac Hadarshan. Imagine se todos aqueles que estão no cemitério recebessem outra meia-hora de vida, para conseguir tanta recompensa celestial quanto lhes fosse possível. Veríamos pessoas correndo para lá e para cá, estudando Torá, visitando os doentes, rezando, consolando os enlutados e fazendo caridade, cada pessoa de acordo com sua habilidade. E se essas pessoas recebessem algumas horas de vida, ou mesmo alguns dias? Não tentariam utilizar o tempo para cumprir tantas mitsvot quanto lhes fosse possível? E quanto a nós - quem de nós sabe quanto tempo ainda lhe resta?
É bem como disse o Chafetz Chaim certa vez: "A vida é como um cartão postal. Quando iniciamos uma viagem, escrevemos em letras grandes e espalhadas. Mas quando vemos que o espaço para escrever no cartão está acabando e ainda há tanto a dizer, começamos a escrever em letras cada vez menores, espremendo as palavras onde quer que haja um cantinho."
Ocorre o mesmo com nosso cumprimento de mitsvot; não somos tão cuidadosos sobre fazer todo o possível porque achamos que há muito tempo à disposição. Mas com o passar da vida, percebemos como o tempo é escasso na verdade, e tentamos espremer tantas mitsvot quantas pudermos. Entretanto, se percebermos agora o valor do tempo, podemos utilizá-lo ao máximo de nossa capacidade.
Por isso, quando estivermos em casa, prazerosamente lendo um livro ou qualquer outra coisa que preferiríamos não interromper, devemos refletir novamente naqueles métodos de incrementar o cumprimento da mitsvá. Devemos nos lembrar como D'us é bom para nós, e o quanto devemos realizar para retribuir pelo menos uma fração disso. Devemos ter em mente a importância e valor de cada minuto e de cada mitsvá. Por fim, devemos considerar que não importa o desafio que seja o cumprimento de uma mitsvá, é um desafio maior que o foi para Avraham levar seu filho ao sacrifício?
Com este reconhecimento, que possamos merecer a realização de mais preceitos, elevando desta maneira nossa recompensa, tanto neste mundo como no Mundo Vindouro.