segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Tehilim - Os Salmos

A principal ferramenta de trabalho do cabalista são as letras hebraicas. A partir delas, formou-se o Universo e é com elas que podemos transmutar a realidade.

As letras podem ser usadas isoladamente ou em grupos. Estes grupos formam nomes, que podem ter um significado intelectual ou não. Em geral, este significado é absolutamente secundário. O que importa é a energia criada pela combinação das letras. Elas são chaves de acesso a estas energias. Por este motivo, não importa se o usuário conhece o idioma hebraico, mesmo que ele não tenha noção do que está lendo, falando ou escrevendo, ele acessará esta energia. É mais um daqueles casos em que temos que ultrapassar a dimensão do lógico, do intelectual, para podermos acessar nossas dimensões superiores.

Tudo o que somos e o que fazemos no Mundo Físico recebe 3 "roupagens": o pensamento, a fala e a ação. Cada uma destas roupagens tem uma força e todas elas são necessárias para que algo se materialize nesta dimensão em que estamos (Malchut). Assim, tudo o que pensamos, falamos e executamos vira realidade. A força e amplitude que este novo ser criado atingirá, depende da energia emocional que colocamos ao criar este novo ser.

Portanto, dentro das práticas cabalistas estão sempre incluídas estas 3 coisas. Muitas vezes, esta ação é o acender uma vela, um incenso. A principal, dentro das linhas mais místicas da cabalá é a escrita. Desenhamos Nomes Sagrados, letras.

Ao desenhar uma letra (especialmente se primeiro nós a contemplamos mentalmente, depois a vocalizamos e depois a escrevemos), criamos um "ser" com aquela energia. Aquele ser continuará influenciando o ambiente a sua volta. Isto se chama "ressonância mórfica" e existe em diversas culturas. Por exemplo, é uma prática comum do Extremo Oriente colocar ideogramas em determinados locais. A simples presença daquele "ser", muda os fluxos energéticos ali existentes. O mesmo é feito com as letras hebraicas. Sozinhas, ou combinadas, elas estão vivas e influenciando aquilo que está ao seu redor.

A partir destes princípios surgiram, dentro da Cabalah, algumas combinações muito poderosas, que são usadas em forma de oração. A principal é o Sêfer HaTorah.

A Torah é o Universo. Ela é a estrutura do Universo materializada. Possuir um pergaminho da Torah em sua casa é algo extremamente luminoso. Lê-lo, olhá-lo, deixá-lo vibrando no ambiente durante algum tempo é fundamental. Por isso, em determinados rituais cabalistas, abrimos e erguemos o Sêfer HaTorah e o visualizamos através das franjas do talit. A Torah também deve ser estudada todas as semanas. Ela deve ser entendida em todas as suas formas: Pshat (significado literal), Remez (entender a metáfora, a lição ali existente), Drash (entender os códigos, através de guematria ou de elucidações existentes em comentários externos, como o Midrash, o Zohar, livros de profetas e comentários de cabalistas) e Sod (segredos místicos, a revelação que se dá pela energia das letras da Torah, o nível muito além do intelectual e do emocional). Quando praticamos estes 5 níveis de entendimento da Torah, atingimos o PRDS, ou PaRDeS, o tal do Paraíso.

Outro livro muito importante nos foi deixado por aquele que melhor soube utilizar as letras e suas combinações: David HaMelech (o Rei David). O famoso episódio de David e Golias narra como ele vence um gigante com uma pedra. Quando os textos nos falam de "pedras", normalmente estão se referindo às letras. Yacov deitou sua cabeça em pedras no monte Moriah e, a partir daí, lutou contra o anjo Peniel e se superou, tornando-se Israel. David também utilizou pedras na atiradeira (combinou-as de forma a uni-las fortemente) e destruiu Golias ao neutralizar sua cabeça, sua fonte. A partir desse evento, o rumo de sua vida mudou, abrindo o caminho para os eventos que o levaram a tornar-se rei de Israel.

Este grande compêndio de combinações de letras, de "pedras para matar gigantes", é o Livro dos Salmos. Obviamente, trata-se da versão hebraica, casher, sem acentuação. É uma grande arma. No entanto, considera-se que fazem efeito as traduções também, já que os idiomas são formados por letras hebraicas (elas são a estrutura da realidade). Os salmos devem ser lidos e recitados. Podemos escolher frases que nos interessam e repeti-las como canções, como mantras. Algumas são clássicas, repetidas há milênios em forma de canção. A leitura do salmo pessoal (sua idade +1), também é muito eficaz para o autoconhecimento.

No Chabad podemos encontrar os salmos hebraicos em português, ou na versão transliterada.

Algumas canções clássicas que são frases dos salmos:

"Hine Ma Tov Umanayim Shevet Achim Gam Yachad" - Como é bom e agradável viverem irmãos juntos em harmonia (Salmo 133)

"Kol HaNeshamah Tehal-El Yah, Halelu-Yah" - Que todos os seres vivos louvem ao Eterno! Louvado seja o Eterno! Haleluiá! (Salmo 150)

"Hodu L'Adonai Ki Tov Ki Leolam Chasdoh" - Agradecei ao Eterno, porque Ele é bom e eterna é Sua misericórdia. (Salmo 118)

"Adonai Sefatai Tiftach Ufi Yaguid Tehilêha" - Adonai, abre os meus lábios e a minha boca proferirá o Teu louvor. (Salmo 51)

"Shiviti Adonai Lenegdi Tamid" - Tenho posto ao Eterno diante dos meus olhos (ou diante de mim, ou à minha frente). (Salmo 16)

Compreendendo ou não o texto, é uma boa prática começar a incluir os Tehilim (salmos) em suas orações e meditações diárias.

Sempre que houver problemas no mundo, perto ou longe de você, recite salmos em nome daqueles que precisam de Luz.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O que é rolo de Tora?




Rabino Mendy Hecht

A - Um Rolo de Torá é um Sefer Torá, que contém os Cinco Livros de Moshê (o Pentateuco) escrito à mão no hebraico original da direita para a esquerda, sem pontuações, vírgulas, pontos, números de capítulos ou versículos. É escrito sobre pergaminho, enrolado ao redor de duas hastes de madeira ornamentadas e adornados com acessórios especiais. É (geralmente) guardado na Arca de cada sinagoga, e rotineiramente lido em voz alta em todas as sinagogas. Em sua presença também oferecemos preces e bênçãos para todos aqueles que necessitam.

B - Um autêntico Rolo de Torá é uma obra prima de “fundir a cabeça” pelo elaborado trabalho manual. Compreende 62 a 84 folhas de pergaminho curado, curtido, raspado e preparado para cumprir exatamente as especificações haláchicas, contendo precisamente 79.847 palavras e 304.805 letras. O Rolo resultante leva de seis a doze meses para ser completado. Cada letra é rigorosamente escrita à tinta com uma pena sob as estritas orientações caligráficas de Ktav Ashurit (Escrita Ashurita). Embora a maioria dos Rolos de Torá tenham cerca de 60 cm de altura e pesem pelo menos 10 quilos, alguns são enormes e pesados, ao passo que outros são miniaturas, leves e com letras compactas.

C - Escrever um Rolo de Torá é a Mitsvá Positiva nº 181, e é obrigação de todo judeu adulto do sexo masculino. Como a maioria não tem tempo nem paciência e devoção nem o conhecimento das centenas (sim, centenas) de Halachot, leis judaicas, envolvidas na escrita de um Sefer Torá, contratamos um Sofer (escriba ritual) para escrever um para nós. No entanto, como isso custa uma fortuna, também, a maioria de nós apenas contribui com uma quantia pequena quando um novo Sefer Torá está sendo escrito para ajudar a cobrir os custos e simbolicamente comprar uma parte da propriedade da Torá, geralmente adquirindo uma letra, um versículo, ou mesmo uma parashá.

Como uma Torá é Feita?

A respostat curta:
Um Rolo de Torá é escrito à mão por um escriba com uma pena e tinta especial em pergaminho cuidadosamente preparado.

A resposta do Askmoses:
Um autêntico Rolo de Torá é uma obra prima de trabalho e talento. Compreende entre 62 e 84 folhas de pergaminho curado, curtido, raspado e preparado segundo especificações haláchicas exatas, contendo precisamente

79.847 palavras num Rolo de Torá e 304.805 letras. O Rolo escrito à mão demora muitos meses para ser completado.

Um escriba especialista escreve cada letra com uma pena, sob as intrincadas orientações caligráficas de Ktav Ashurit. As folhas de pergaminho são então costuradas juntas com tendões para formar um longo rolo. Embora a maioria dos Rolos de Torá tenha cerca de 60 cm de altura e pese 10 a 12 quilos, alguns são enormes e bastante pesados, ao passo que outros são pequenos e leves.

O Pergaminho

Um Rolo de Torá somente pode ser escrito num pergaminho proveniente da pele de um animal casher. No entanto, o animal não precisa necessariamente ser abatido de maneira ritual. Desde que a espécie seja casher, o pergaminho pode ser usado para um Rolo de Torá. O pergaminho feito de pele de peixe não pode ser utilizado para este fim; a pele de peixe exala um odor desagradável que não é apropriado a um Rolo de Torá. O pergaminho deve ser preparado com a intenção de ser usado para um Rolo de Torá. Portanto, um judeu deve cumprir ou, pelo menos, ajudar nesta tarefa.

Antes de começar a escrever um Rolo de Torá, o escriba deve assinalar as linhas sobre o pergaminho com leves ranhuras. O utensílio usado para este fim não deve deixar qualquer marca colorida sobre o pergaminho.

A Tinta

Somente tinta preta é aceitável. Tinta de qualquer outra cor não é casher para um Rolo de Torá. Deve também ser permanente – não apagável.

Nos tempos antigos, a tinta usada para escrever um Rolo de Torá era obtida através da fervura de óleos, alcatrão e cera, e coletando-se os vapores. Mais tarde, aquela mistura seria combinada com seiva de árvore e mel, e então seca e armazenada. Antes do uso, era misturada com suco de nozes de carvalho. Atualmente, os escribas preparam a tinta usando suco de nozes de carvalho e resina. A cor negra é conseguida acrescentando-se vários pigmentos.

A Pena

O escriba escreve com uma pena de ave ou re junco, enchendo sua ponta com a tinta. Uma pena de ferro não é adequada porque pode furar o pergamimho; o ferro com freqüência é usado para fazer armas de morte e destruição, e ambos se opõem ao intento da Torá.

A Caligrafia

As letras de um Rolo de Torá são grafadas na “escrita assíria”; as várias fontes e escritas nas quais o hebraico é comumente escrito ou impresso não são válidas. As linhas devem ser perfeitamente retas e iguais. Numerosas leis detalham a figura exata de cada letra, e se uma só letra estiver faltando ou, em alguns exemplos, com alguma falha ou borrão – o Sefer Torá inteiro não é casher. Um Rolo de Torá impresso, mesmo que as letras estejam na forma exigida, não é válido.

Como o Sefer Torá incorpora a santidade de sua mensagem, deve concentrar-se exclusivamente em seu texto puro; quaisquer ilustrações ou enfeites artísticos são proibidos.

O Escriba
Tornar-se um escriba é tarefa que exige rigoroso estudo e treinamento – e grande habilidade. Certamente, uma pessoa que não estudou cuidadosamente as leis referentes à composição de um Rolo de Torá não pode ser escriba.

Acima de tudo, porém, o escriba deve ser um homem piedoso e temente a D’us, dedicado à santidade do Sefer Torá.

O escriba não pode confiar em sua memória, mas deve copiar as letras, palavra por palavra, de um Rolo de Torá casher. Um escriba destro escreve somente com a mão direita; um escriba canhoto somente com a mão esquerda. O Sefer Torá, e especialmente os Nomes de D’us ali contidos, devem ser escritos com a maior pureza e devoção. É costume, portanto, que o escriba faça uma imersão num micvê (piscina ritual) antes de começar seu trabalho. Ele também recita uma bênção no início de seu trabalho e antes de cada vez que escreve o Nome de D’us.

Por que as pessoas “compram” letras num Rolo de Torá?

Resposta

Rabino Shlomo Chein

A última das 613 mitsvot ordenadas na Torá é que cada indivíduo escreva o próprio Sefer Torá completo. Nossos Sábios ensinam que o cumprimento dessa mitsvá é equivalente a receber a Torá no Monte Sinai.

1.No caso de alguém não ser capaz de escrever um Sefer Torá por si mesmo (faltando o necessário conhecimento, tempo, meios, etc.) a pessoa pode contratar um escriba para escrever em seu lugar, ou fazer parte de um grupo que está contratando um escriba para escrever uma Torá para o grupo inteiro como uma comunidade. Se pelo menos uma letra for escrita em nome de cada indivíduo, eles todos cumprirão a mitsvá de escrever um Sefer Torá. Como cada letra é essencial para tornar a Torá casher, qualquer letra pode ser considerada aquela que completa a Torá – e completá-la é considerado como a tendo escrito por inteiro.

2. Todo judeu tem uma letra na Torá que corresponde à sua alma, a qual é a fonte do sustento daquela alma. Através da aquisição de uma letra num Sefer Torá, fortalecemos aquela conexão.

3. Porém ainda há mais. Ao participar na escrita de um Sefer Torá comunitário, nos unimos com centenas de milhares de judeus e fortalecemos a unidade judaica através da Torá, trazendo sobre nos paz e bênção. E a mitsvá final da Torá é especialmente auspiciosa durante os momentos finais de nosso exílio, aqueles tempos mais sombrios e caóticos. Certamente, essa mitsvá servirá como o grand finale e completará nossas realizações espirituais, pondo um fim a toda escuridão, conflitos e sofrimento para sempre, com a chegada de Mashiach, que seja em breve, em nossos dias!


Yom Kipur
O Dia do Perdão, o mais santo do calendário judaico, é também chamado de Dia do Arrependimento. Marcado por jejum e preces, é o dia de pedir perdão ao próximo e a D'us. O destino de cada um é selado neste dia.
17-18 de setembro, 2010 – 10 de Tishrei

Sucot
A Festa dos Tabernáculos ou Cabanas comemora a proteção Divina aos Filhos de Israel durante os 40 anos de peregrinação no deserto. Sucot também é chamada Festa da Colheita, quando os frutos da terra são armazenados em Israel. Durante Sucot, uma bênção especial é recitada sobre as Quatro Espécies: cidra, palma de tamareira, murtas e salgueiros.
22-29 de outubro, 2010 – 14-21 de Tishrei

Shemini Atsêret
O "Oitavo Dia da Assembléia Solene" é uma festa à parte ao final de Sucot. Há uma prece especial por chuvas para a Terra de Israel.
30 de setembro, 2010– 22 de Tishrei

Simchat Torá
O dia do "Júbilo com a Torá" no qual o ciclo anual da leitura da Torá é terminado e reiniciado. Nesta data dançamos e nos alegramos com a Torá.
1 de outubro, 2010 – 23 de Tishrei

Chanucá
Chanucá comemora a reinauguração do Templo Sagrado de Jerusalém, após a vitória dos macabeus. É celebrada durante oito dias através do acendimento da menorá que lembra os milagres ocorridos.
2-9 de dezembro, 2010 – 25 de Kislêv - 2 de Tevet

Tu Bishvat

Ano Novo das Árvores. É costume comer frutas com as quais a Terra de Israel é louvada.
20 de janeiro, 2011– 15 de Shevat


Purim
Purim comemora a libertação do povo judeu da destruição planejada pelo perverso Haman. A história é relatada na Meguilá de Ester.
19-20 de março, 2011– 13-14 de Adar II

Pêssach
Pêssach comemora a libertação do povo judeu da escravidão no Egito. Uma das maiores mitsvot durante esta festa é a proibição de consumir alimentos fermentados e a obrigação de comer matsá.
19-26 de abril, 2011– 15-22 de Nissan

Pêssach Sheni
Observado um mês após Pêssach como uma segunda chance para oferecer o cordeiro pascal aos que não conseguiram fazê-lo na véspera de Pêssach. Costuma-se comer um pedaço de matsá neste dia.
18 de maio, 2011– 14 de Iyar

Lag Baômer
Entre Pêssach e Shavuot os discípulos de Rabi Akiva faleceram de uma praga, gerando um período de meio-luto que dura até hoje, mas no dia de Lag Baômer a praga cessou. Esta data marca o falecimento de Rabi Shimon bar Yochai.
22 de maio, 2011– 18 de Iyar

Shavuot
Shavuot, a Festa das Semanas, comemora a Outorga da Torá no Monte Sinai sete semanas após a saída do Egito. Neste dia os Dez Mandamentos são lidos nas sinagogas. Também é chamada Chag Habicurim, a Festa das Primícias, levadas ao Templo a partir de Shavuot.
8-9 de junho, 2011 – 6-7 de Sivan

17 de Tamuz e as três semanas
Este período entre os jejuns de 17 de Tamuz e 9 de Av inclui três semanas de luto pela destruição de Jerusalém e o exílio do povo judeu.
17 de Tamuz – 19 de julho
As Três Semanas tem início 19 de julho de 2011

Tishá B’Av
9 de Av é um dia de luto e jejum pela destruição do Templo Sagrado de Jerusalém e exílio do povo judeu.

Tishá Be’Av - 9 de agosto de 2011– 9 de Av

Tu B’Av
É um dia festivo por vários fatos históricos alegres que aconteceram nesta data. Muitos casamentos eram celebrados nesta data.
15 de agosto, 2011– 15 de Av

Rosh Hashaná
O Ano Novo judaico é o Dia do Julgamento, quando D'us determina o destino de cada um para o ano que se inicia. Parte principal do serviço de Rosh Hashaná é o toque do shofar, o chifre de carneiro, que desperta as pessoas para o arrependimento.
29 a 30 de setembro, 2011 – 1-2 de Tishrei

Notas:

O dia judaico
Todas as datas judaicas iniciam-se ao entardecer do dia anterior a data específica. Isto deve-se ao fato de que o "dia" judaico começa e termina ao pôr-do-sol, ao invés da meia noite. Para saber precisamente a hora em que um novo dia inicia-se no calendário judaico consulte a tabela de horário de velas para Shabat e Yom Tov.

Tefilin
Não são colocados em chol Hamoed (dias intermediários de) Pêssach e Sucot, e durante as festas de Shavuot, Rosh Hashaná, Yom Kipur, Hoshaná Rabá, Shemini Atsêret e Sichat Torá.

Yizcor
Recita-se no último dia de Pêssach, no segundo dia de Shavuot, em Yom Kipur e em Shemini Atsêret.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Uma parábola sobre o sentido da vida: Reflexões sobre a Parashá Chayei Sarah.

Por Rabino Marc D. Angel

Na porção desta semana da Torá, lemos sobre as mortes de Sara e Abraão - o casal fundador do monoteísmo ético e do povo de Israel. Suas vidas têm deixado uma marca profunda na história da humanidade, desde que vamos refletir sobre suas vidas e mortes, seria bom para e refletir sobre o sentido da vida para nós mesmos. Uma parábola rabínica nos oferece uma perspectiva aguçada.
A parábola conta de um homem pobre que lutava para sustentar sua família. Ele ficou sabendo de uma terra distante cheia de jóias preciosas. Para sua sorte um navio logo estaria partindo para essa terra e tinha uma vaga para ele como passageiro. Porém o navio só voltaria após um intervalo de duração indeterminado. Sua esposa concordou que ele deveria fazer a viagem, de modo a ser capaz de obter valiosas jóias que traria de volta para poder sustentar sua família em termos de riqueza e honra.
Então, o homem embarcou no navio e partiu para fazer fortuna. O navio chegou naquela terra distante, e ele comprovou que tudo era verdade sobre os tesouros. A terra estava coberta de diamantes e de todos os tipos de pedras preciosas. Ele rapidamente encheu os bolsos de jóias, ele encheu suas bolsas com pedras preciosas. Ele era agora um homem extraordinariamente rico. Ele se alegrou com o pensamento de quão rico ele e sua família seriam logo o seu retorno para casa.

Mas na terra longínqua, o homem logo percebeu que suas pedras preciosas eram sem valor. Eles eram tão abundantes que ninguém prestava atenção a elas. Nenhum dos lojistas as aceitavam como forma de pagamento. Pelo contrário, a moeda desta terra era velas de cera. Estas eram difíceis de se encontrar, e foram altamente valorizadas pelo público. Todos se esforçaram para acumular o máximo de velas de cera como for possível, a riqueza e o poder eram avaliados pelo número de velas que possuíam.
Não demorou muito para que o homem a reconhecer sua necessidade de velas de cera. Ele trabalhou duro para ganhar tantas quanto podia. Logo, tinha acumulado um grande número delas. Ele esvaziou os bolsos e bolsas dos diamantes, rubis e esmeraldas, e encheu-los em vez de velas de cera. Nessa nova terra, ele se tornou rico e importante - uma pessoa muito bem sucedida.

O tempo passou. Era chegada a hora do homem voltar à sua esposa e família. O navio estava pronto para sair. Rapidamente, o homem embalou quantas velas de cera quantas podia. Ele orgulhosamente embarcou no navio, carregado com muitas velas.
Quando ele chegou em casa, sua esposa ansiosamente o cumprimentou. Ela pediu para ver os tesouros que ele tinha trazido de volta. Orgulhosamente, o homem abriu os sacos e esvaziou os bolsos. Ele empilhou montanhas de velas de cera. Sua esposa ficou atônita. "Você gastou todo esse tempo numa terra distante, uma terra repleta de jóias preciosas, e você trouxe de volta só de velas de cera sem valor?"
Logo, o homem percebeu que tinha cometido um erro terrível. Quando ele chegou naquela terra distante, ele sabia que devia reunir pedras preciosas - mas logo esqueçeu sua missão. Influenciado pelo povo dessa terra, ele viu nas velas valor e ignorou as jóias. Ele pensou que acumulando velas se tornaria bem-sucedida. Mas agora que ele voltou para casa, ele percebeu que tinha perdido a sua oportunidade para trazer de volta tesouros reais. Em vez disso, ele voltou com um monte, quase inútil, de velas.

Fomos colocados nesta terra para atingir tesouros transcendentes: sabedoria, amor, discernimento espiritual, coragem moral, estudo da Torá e mitsvot. Se conseguirmos manter nossas vidas focadas nesses objetivos, podemos voltar ao nosso lar celestial com os verdadeiros tesouros. Mas neste mundo, as pessoas correm atrás das "velas" - a riqueza material, carros de luxo, glamour, estilo de vida hedonista. Neste mundo, as pessoas são julgadas de "sucesso" pelos padrões falsos do materialismo e do hedonismo. É possível perder de vista os nossos verdadeiros tesouros e metas, perseguindo os valores da nossa sociedade. Quando, finalmente, voltamos para casa - a nossa casa celestial no além -
podemos perceber que estamos trazendo conosco "velas" em vez de pedras preciosas - que tínhamos vivido nossas vidas seguindo falsidades e vaidades, em vez de perseguir a bondade, a verdade e a piedade.

Sucesso na vida significa manter focado no que é verdadeiramente importante e não se desviar pelo brilho externo. Sucesso não é um evento isolado, mas ele vem de forma contínua na vida.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O que é Cabalá?

Uma introdução básica aos três tipos de Cabalá

A
tradução literal da palavra Cabalá é "aquilo que é recebido". Para receber, devemos ser receptivos. Devemos nos abrir, criando um receptáculo para absorver aquilo que desejamos entender, até nos tornarmos parte da Cabalá. Abrir o ser para uma realidade mais elevada, visualizar o espírito dentro da matéria, elevar nossa consciência até o ponto em que nossa percepção da realidade é completamente mudada, e o Divino dentro de toda a Criação é revelado.

Falando de forma geral, a Cabalá está dividida em três categorias: a teórica, que se preocupa basicamente com as dimensões interiores da realidade; a dos mundos espirituais, almas, anjos e coisas semelhantes, e a meditativa, na qual a meta é treinar a pessoa que está estudando para atingir estados meditativos mais elevados de consciência e talvez, até um estado de profecia através do emprego dos Nomes Divinos, permutações de letras e assim por diante. Este último tipo de Cabalá é o mágico, que se preocupa em alterar e influenciar o curso da natureza.

A grande maioria dos textos mais importantes da Cabalá mágica jamais foi publicada, talvez por um bom motivo. Além de ser um assunto altamente complexo para dominar, mesmo quando dominado às vezes pode ser perigoso. R. Joseph Della Reina (1418-1472) foi um dos grandes mestres da Cabalá mágica. Conta a lenda que ele tentou utilizar seus poderes espirituais para trazer a suprema Redenção, e no processo de fracasso ficou espiritualmente ferido. Alguns dizem que cometeu suicídio, ao passo que outros afirmam que se transformou num apóstata. Outros ainda dizem simplesmente que enlouqueceu.

Muitos cabalistas na geração seguinte tomaram suas ações como uma advertência contra a prática da Cabalá transcendental avançada e mágica. A partir de então, os elementos mágicos da Cabalá têm, para todos os fins e propósitos, se extinguido, e seu conhecimento completamente esquecido.

Qualquer que seja o motivo, a Cabalá meditativa nunca foi uma disciplina popular. Um dos grandes proponentes da Cabalá meditativa foi Rabino Abraham Abulafia (1240-1296). A escola mística que ele dirigia estava basicamente interessada num método para atingir estados meditativos mais elevados. Ele acreditava que através do seu método de meditação, a pessoa estava apta a atingir um nível de profecia.

Ele propunha usar um mantra escrito, querendo dizer que em vez do costumeiro mantra verbal ou visual, a pessoa deveria escrever uma palavra repetidamente, muitas vezes, em diversos estilos e configurações. Deveria tentar alterar a seqüência da palavra e permutar e circundar as letras da palavra em todas as maneiras possíveis: combinando e separando as letras, compondo associações completamente novas de letras, agrupando-as e depois juntando-as com outros grupos, e assim por diante. Isso era feito até a pessoa atingir um estado mais elevado de percepção.

Ora, embora Abulafia fosse um escritor prolífico e autor de mais de quarenta livros durante sua vida, mesmo assim a maioria de suas obras jamais foi publicada. De fato, mesmo durante sua vida, muitos dos outros grandes cabalistas se opuseram a ele e aos seus ensinamentos.

Portanto, a Cabalá, na qual a meta era atingir o estado transcendental de consciência, jamais se tornou importante embora em nível individual, havia diversos cabalistas, especialmente aqueles da Safed do século dezesseis, que incorporaram seus ensinamentos como uma maneira de atingirem estados mais elevados de percepção e consciência.

O que nos resta é a dimensão teórica da Cabalá. A vasta maioria da Cabalá que foi e está sendo continuamente produzida está toda dentro do âmbito teórico. O corpo principal deste tipo de Cabalá é o sagrado livro Zohar, uma obra de ensinamentos do místico talmúdico do segundo século, Rabi Shimon bar Yochai, que foram transmitidos de geração em geração até serem publicados no final do Século Treze pelo cabalista R. Moshe de Leon.

Os três estágios do desenvolvimento da Cabalá teórica

É o aspecto teórico da Cabalá que tem sido desenvolvido através dos tempos em diversos estágios. Para fins práticos, a tradição deste estilo de Cabalá pode ser dividido em três estágios básicos. O primeiro é a era da publicação do Zohar, com a mística do livro e a geração seguinte que articulou estes ensinamentos. O segundo seriam os místicos do Século 16 que viveram na cidade de Safed. Este período específico da história é mencionado como a grande Renascença Cabalista. O movimento foi guiado pelos profundos e sistemáticos ensinamentos de R. Yitschac Luria (1534-1572). Ultimamente, o terceiro desenvolvimento da Cabalá foi com o nascimento de R. Yisrael ben Eliezer (1698-1760), conhecido como Báal Shem Tov, o Mestre do Bom Nome, fundador do Movimento Chassídico, que de maneira direta ou indireta tem orientado todos os outros movimentos até os dias de hoje.

Alguém que tenha tido apenas vislumbres da Cabalá teórica – o novato – tende a considerá-la um escrito repleto de fantasia, ocorrências e imagens estranhas, fantásticas paisagens místicas, aparentemente irracionais, irreais e sem base na realidade. Ao abrir a obra clássica da Cabalá teórica, o Zohar, a pessoa se surpreende com a imaginação dos autores, mas talvez o fascínio termine aí. Para o novato ele se parece com um livro de fantasia, nada além disso. Um famoso mestre cabalista, o Tsadic de Zitshav, disse certa vez sobre a Cabalá que estes três estágios em seu desenvolvimento podem ser relacionados com uma parábola.

Numa época em que viajar era uma aventura perigosa e árdua e a maioria da pessoas jamais saíra de sua própria aldeia, um homem viajou a um país distante. Ao voltar, reuniu o povo de seu vilarejo e entusiasmado, relatou as aventuras de sua viagem. Falou sobre uma ave que tinha visto num país distante, cuja aparência era fantástica. Por exemplo, o pássaro tinha feições humanas; as pernas eram como as de uma girafa. Os aldeões zombaram da história, considerando-a pura fantasia.

Inspirado pelas aventuras que ele contou, um aldeão saiu para fazer a mesma viagem, determinado a ver o mundo por si mesmo. Anos depois retornou à aldeia, um homem do mundo. Assim como o viajante que tanto o inspirara, ele reuniu as pessoas do lugar e relatou suas aventuras. Também falou sobre aquele pássaro fantástico, mas sua descrição era um pouquinho diferente. A face da ave, disse ele, não era realmente humana, embora lembrasse bastante um homem, e as pernas eram longas e finas, definitivamente lembrando uma girafa; no entanto, não eram realmente pernas de girafa. Ao ouvirem a história deste homem, os aldeões ficaram divididos. Alguns acreditaram piamente no homem, cuja história era mais convincente que a do primeiro viajante. Apesar disso havia muitos cépticos, para quem a história ainda soava inventada e irreal.

Um dos habitantes da vila estava determinado a pôr um ponto final no assunto deste pássaro estranho e empreendeu a longa viagem para vê-lo por si mesmo. Ao voltar, reuniu os moradores locais e triunfante, declarou: O assunto está resolvido! Abriu uma bolsa grande e dali retirou a estranha e fantástica ave. Desta vez ninguém duvidou.

Esta parábola se relaciona com os três estágios de desenvolvimento do âmbito teórico da Cabalá. O autor do Zohar, a obra magna do pensamento cabalista, Rabi Shimon bar Yochai, foi o primeiro a descrever a Divina presença e nosso relacionamento com o Ein Sof. No Zohar, encontramos histórias tão estranhas e fantásticas, configurações e imagens tão míticas e místicas, que mal podemos acreditar. No Século 16 em Safed, a cidade dos místicos, a Cabalá começou a adotar uma forma de análise mais abrangente e detalhada. Os padrões e os processos de pensamento sistemático começaram a aparecer na literatura cabalista. Por fim, com o nascimento do Movimento Chassídico, a Cabalá amadureceu.

O Chassidismo é o movimento místico fundado pelo R. Yisrael ben Eliezer, o Báal Shem Tov. Ele trouxe a imagem do Criador até a realidade. Estes conceitos místicos não eram mais irreais e distanciados, mas se tornaram uma parte concreta da nossa vida diária, afetando cada faceta da criação. O Céu foi trazido à Terra.

A jornada cabalista completa um círculo

A opinião das pessoas sobre o propósito da Cabalá está repleta de equívocos. Um dos mais populares é que o estudo da Cabalá pretende transformar a pessoa num vidente, capaz de ter habilidades miraculosas e sobrenaturais. Isso, no entanto, é equivocado. O supremo propósito no estudo da Cabalá é a perfeição do Ser. Transformar o Ser num indivíduo melhor, mais expandido, mais transcendente, mais sintonizado com a essência e as raízes da própria alma, é isso que a Cabalá oferece àqueles que realmente desejam recebê-la.

O critério da jornada autêntica e cabalista é aquele que faz um círculo completo e a pessoa termina voltando ao mundo do aqui e agora. O Talmud fala dos quatro Sábios que entraram no pomar celestial e tiveram uma experiência transcendental. Ben Azzai olhou e morreu. Ben Zoma olhou e ficou transtornado. Em outras palavras, ficou louco. Acher (o outro, nascido Ben Avuyah) olhou e arrancou suas plantas, ou seja, transformou-se num herege. Rabi Akiva entrou e saiu em paz. O pomar representa os reinos espirituais mais elevados. Rabi Akiva foi o único sábio, dentre estes quatro, que pôde entrar e sair no pomar místico sem sofrer danos.

Sendo um homem de grande estatura espiritual, um mestre verdadeiro e equilibrado, ele percebeu que o objetivo não é se identificar com a luz e não retornar, como fez Ben Azzai, ou mentalmente, como Ben Zoma. Também não era sentir alívio pessoal ou êxtase, mas sim ir e voltar para cá, com a sabedoria adequada para servir aqui e agora. A jornada deve percorrer um círculo completo no comportamento do dia-a-dia da pessoa.

Agora, porém, o âmago de toda a Cabalá é o objetivo distinto de atrair a Luz Infinita da santidade abstrata para a realidade do dia-a-dia. E os primeiros cabalistas eram conhecidos como "Homens de labuta" – seus esforços não eram de natureza física, mas trabalharam durante toda a vida para se aperfeiçoarem e elevar seu nível de consciência até o ponto de uma percepção espiritual da realidade. Com a chegada do Báal Shem Tov, esta noção adquiriu um significado novo. Com os ensinamentos do Báal Shem Tov, a trilha tornou-se tão clara a ponto de este refinamento poder ser alcançado.

Conhecer a Cabalá é viver cabalisticamente

A Cabalá é comparada à proverbial "árvore da vida". É um estudo da vida, e assim como a vida não pode ser estudada num livro, mas somente através da própria vida, também o estudo da Cabalá somente é eficaz quando se pratica os seus ensinamentos em nossa vida diária. A Cabalá estudada como uma matéria escolar num livro é como alguém que estuda 'amor', mas jamais o experimenta por si mesmo.

R. Simchá Bunem de Pshischá, famoso mestre chassídico, disse certa vez sobre um famoso cabalista que ele não tinha compreensão sobre a Cabalá. Explicou que embora fosse verdade que ele era versado na literatura cabalista, não tinha um verdadeiro entendimento. Para ilustrar o que queria dizer, ofereceu a seguinte metáfora. Digamos, por exemplo, que uma pessoa deseja se familiarizar com Paris. Compra um mapa e um guia da cidade e os estuda diligentemente, até conhecer todos os detalhes e os caminhos da cidade; porém, é desnecessário dizer que se ele jamais visitar aquela cidade, jamais saberá realmente como é Paris. O coração e o pulso de qualquer cidade somente podem ser sentidos quando se vai lá. Assim também, concluiu Reb Bunem, para entender totalmente a Cabalá, a pessoa deve vivê-la, e isso aquele cabalista não tinha feito.

O refinamento do caráter

É preciso apenas um breve vislumbre da obra dos grandes mestres da Cabalá teórica para perceber que a grande maioria dos textos não tratam de transformação do caráter. Embora seja verdade que a literatura mística cabalista seja voltada ao ato de relacionar o teórico com a vida diária, a Cabalá em si parece não se importar tanto com a pessoa. Ao contrário, parece estar interessada em explicar as esferas celestiais, anjos, almas e 'coisas' deste tipo, não como o indivíduo pode vencer o comportamento negativo.

No entanto, isso não implica que a Cabalá não esteja interessada na pessoa em si. Ao contrário! Na verdade, há incontáveis declarações em todas as obras da Cabalá sobre a negatividade dos maus traços de caráter, como raiva, preguiça, depressão, e outros. A condenação mais severa da depressão, fúria e outras emoções prejudiciais são encontradas nas obras da Cabalá. Porém o método cabalista de refinamento de caráter é uma abordagem bem diferente daquela que estamos acostumados a encontrar. Não é uma batalha que combate a negatividade em seu próprio campo, e também não se trata de superar o negativo com o positivo. Sua abordagem é vir de outro ponto de vantagem e ver as coisas sob outras perspectiva.

O objetivo fundamental do pensamento místico é fazer a pessoa entender que não há nada além do Infinito. Ao ler as várias configurações, mapas e diagramas que a Cabalá apresenta, a pessoa desperta à conscientização de que tudo que realmente existe é o Ein Sof. Há uma sensação que deve ser despertada quando penetramos nas verdades da Cabalá, e esta é a sensação de que o mundo como temos a tendência de percebê-lo, separado, independente de um criador, é apenas uma ilusão, e na realidade não há nada que não seja a luz infinita. Tendo esta noção em mente, consciente ou subconscientemente, estamos aptos a conquistar todas as nossas emoções e traços negativos.

O ego: o falso senso do ser como fonte de todas as emoções negativas

Rabi Eliyahu ben Moshe di Vidas, um cabalista do Século 16, declara que há três traços negativos básicos, que podem ser considerados "os traços principais'" a partir dos quais ocorre toda dissensão. São eles: arrogância, teimosia e fúria, dos quais todos alegam originar-se na mesma fonte, ou seja, o ego. O ego é a fonte a partir da qual brota toda a negatividade. O âmago de toda a corrupção é aquele falso senso de ser/ego, que vive num estado incessante daquilo que pensa que irá causar a sua sobrevivência.

É o ego que faz surgir todas as emoções negativas. Por exemplo, quando uma pessoa fica furiosa, é a maneira do ego de demonstrar sua objeção porque não está feliz. O ego, quando sente que está ameaçado, é aquele que protesta: 'como você pode fazer isso comigo' – o que desperta a raiva. O medo da aniquilação é a constante condição do ego. A raiva é apenas uma manifestação da preocupação da pessoa com sua presunção imaginária de sobrevivência. O total envolvimento com o "eu" ilusório é a raiz de todas as emoções negativas.

Ao superar este falso senso de ser, que brota da falsa estimativa de sobrevivência da pessoa, as emoções negativas são dominadas. Por meio do estudo da Cabalá, chegamos à percepção de que o falso senso de ser/ego é apenas um disfarce de nossa real dinâmica interior, nossa alma transcendente. A sensação que temos quando contemplamos a Cabalá é que tudo existe é Ein Sof. Procuramos sentir isso num nível cósmico, e então entendê-lo em nosso próprio nível.
Conseqüentemente, a ilusão de separação/ego e, como resultado, a preservação dessa miragem começará lentamente a desaparecer, e com ela desaparecerão as emoções negativas que são a manifestação do ego.

Em vez de ver o ego como um inimigo real que precisa entrar na batalha para ser superado, começamos a perceber que não há nada além da Luz, e tudo o mais é simplesmente uma ocultação daquela verdade. Esta é a abordagem cabalista para a auto-perfeição. Não lida com o ataque negativo, de maneira alguma. Ao contrário, busca a fonte de todos os problemas, o Eu/ego, e por extensão, toda a realidade física, e demonstra como, de fato, estas realidades aparentemente independentes não passam de uma camuflagem. Ao perceber isso, nossa negatividade é dominada com mais facilidade.

Por Dov Ber Pinson

Link de alguns Vídeos relacionados a Cabalá


Cabalá

A Origem da Cabalá

A ética da responsabilidade judaica

Vivemos hoje um estranho paradoxo. Somos confrontados diariamente por imagens de catástrofes globais: terror, terroristas suicidas, danos ao meio ambiente, países e continentes afetados pela pobreza e doenças, além dos desastres naturais como o tsunami que custou tantas vidas há meses. Existe algo natural – um instinto básico de empatia e simpatia – que nos faz querer ajudar quando vemos pessoas sofrendo.

Ao mesmo tempo, com freqüência nos sentimos pequenos e insignificantes. O que podemos fazer para ajudar? O impacto que podemos causar parece inadequado perante a escala dessas tragédias. Há seis bilhões de pessoas atualmente. Que diferença um indivíduo pode fazer? Somos apenas uma onda num oceano de humanidade, poeira na superfície do infinito.

No livro To Heal a Fractured World tentei contar a história da "ética da responsabilidade" judaica. É uma história para o nosso tempo. O Judaísmo começou com Avraham, um único indivíduo. E continua a ser a fé de um dos menores povos do mundo. Porém os judeus sempre causaram impacto desproporcional aos números. Por quê?
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Vivemos hoje um estranho paradoxo. Somos confrontados diariamente por imagens de catástrofes globais: terror, terroristas suicidas, danos ao meio ambiente, países e continentes afetados pela pobreza e doenças.... Existe algo natural – um instinto básico de empatia e simpatia – que nos faz querer ajudar quando vemos pessoas sofrendo.

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O motivo está na crença radical imbuída no âmago da nossa fé, de que podemos fazer a diferença – e que devemos fazê-la. D'us nos conclama a nos tornarmos Seus "parceiros na obra da Criação". O Judaísmo não é uma fé que nos leva a aceitarmos o mundo como ele é. É uma fé que nos desafia a fazer o mundo como ele deveria ser. É um grito de protesto contra as injustiças e crueldades aleatórias do mundo.

Em meu livro, "To Heal a Fractured World, explico algumas das idéias principais da ética judaica: tsedacá (justiça social), chessed (atos de bondade), darchei shalom (os caminhos da paz), Kidush Hashem (santificar o Nome de D'us), e o princípio de que "todos os judeus são responsáveis uns pelos outros". O livro tira seu nome da famosa idéia do místico do século dezesseis, Rabi Yitschac Luria, conhecido como ticun olam – ou seja, que somos chamados para remendar as fraturas do mundo, uma ação por vez, um dia por vez.

Nossa tendência é considerar estas idéias como algo estabelecido como se fossem auto-evidentes, mas não são. Estão enraizadas numa visão singular de D'us, do universo e de nosso lugar nele. O Judaísmo mantém uma visão extremamente alta da dignidade e importância do indivíduo – em oposição às massas, à multidão, à nação, ao império. Não acreditamos que somos manchados pelo pecado original, ou que o destino está totalmente nas mãos da Providência. D'us nos habilita, como um pai sábio capacita seu filho, a crescer, desenvolver-se e exercer responsabilidade. Estamos aqui para fazermos uma diferença.

Originalmente, quando escrevi o primeiro rascunho, presumi que seria de interesse somente dos leitores judeus. Fiquei surpreso quando um não-judeu após outro disseram-me – quando lhes contei em qual livro eu estava trabalhando – que desejavam lê-lo. Foi então que percebi como a ética judaica é relevante para os problemas do século 21. Muitas e muitas vezes, nestes anos que passaram, fiquei surpreso por ver como o público em geral é receptivo à ética judaica, nascida há tanto tempo. A Torá realmente é, como está escrito em Devarim, "sua sabedoria e entendimento aos olhos das nações".

A ética da responsabilidade é a chave que dá acesso a uma vida satisfatória। No fim, o que nos faz sentir realizados não é o quanto ganhamos, ou o que possuímos, mas a sensação de termos contribuído com algo de valor para o mundo. O livro é minha maneira de dizer obrigado aos milhares de judeus que conheço, que se engajaram em atos de compaixão e generosidade, cuidando dos doentes, confortando os enlutados, oferecendo hospitalidade aos solitários e ajudando aqueles que precisam. To Heal a Fractured World conta sua história, e a fé sobre a qual ela é construída – que todo ato de bondade acende uma vela de esperança num mundo muitas vezes escuro e perigoso.

Rabino Chefe Da Inglaterra, Professor Jonathan Sacks

De onde vem a ética?

É certo clonar seres humanos? Existe uma vida que não seja digna de ser vivida? Quando é correto ir para a guerra? O terrorismo está sempre errado? Há algo de errado nos casamentos entre pessoas do mesmo sexo? O aborto deve ser legalizado?


A lista dos dilemas éticos do Século 21 é interminável. O ponto chave a esse respeito é: como e baseados em quais tendências respondemos esses dilemas éticos. Na verdade, esta é uma pergunta que preocupava os antigos filósofos.


Na filosofia ocidental há geralmente três opiniões sobre a origem da ética. Primeiro existe a "Teoria da Ética do Divino Comando", defendendo que a ética origina-se de D'us – que aquilo ordenado por D'us é arbitrariamente bom e ético. O contra-argumento a isso afirma que esta opinião leva ao absurdo onde D'us pode, em teoria, decretar o adultério como sendo ético. Se alguém argumentar que D'us não pode fazer isso está admitindo que os padrões éticos são estabelecidos por algo que não seja D'us!1


Em seguida à Teoria do Comando Divino está a Teoria das Formas, apresentada por Platão, afirmando que há uma "forma" independente fora de D'us, que é o padrão absoluto de moralidade e ética. O problema aqui é que este padrão absoluto jamais foi revelado a um mundo espaço-temporal, portanto não se pode ter certeza de que alguém atingiu o padrão absoluto da ética. Nós, portanto, ficamos com o dilema original: o que é ético?


O terceiro ponto de vista sustenta que todo o conhecimento é relativo ao indivíduo, e neste caso não pode haver moralidade absoluta: toda a ética é relativa às circunstâncias, pessoas e culturas. e neste caso não pode haver moralidade absoluta: toda a ética é relativa às circunstâncias, povos e culturas. Esta opinião também é problemática porque, levada à sua conclusão lógica, não existe qualquer ética.2


Há um versículo enigmático na Torá que parece estar diretamente relacionado a esse debate. D'us diz a Moshê: "Fala a toda a congregação dos Filhos de Israel, e diz a eles: Vocês devem ser sagrados, pois Eu, o Eterno teu D'us, sou sagrado."3


A ordem "Vocês devem ser sagrados" provoca debate entre os comentaristas. Alguns dizem que isso significa que a pessoa deve ser especialmente cuidadosa em questões de moralidade sexual.4 Baseando sua opinião no Talmud, outros dizem que isso se refere à necessidade de exercer a autodisciplina até em questões que não levam proibição da Torá. Segundo esta opinião, "Vocês devem ser sagrados" implora para que a pessoa seja sempre abstêmia e autodisciplinada quando se trata de prazeres materiais.5 É interessante notar que esta interpretação do versículo é idêntica à opinião de Aristóteles sobre como a conduta ética humana deve ser determinada.

"Vocês devem ser sagrados, pois Eu, o Eterno seu D'us, sou sagrado" pode parecer um argumento um tanto vago para a conduta ética; no entanto, encerra uma explicação muito profunda sobre a origem da ética.


D'us criou o homem "à Sua imagem".6 Segundo os cabalistas, este versículo indica que D'us possui atributos (midot ou sefirot). No sistema cabalista há dez atributos Divinos, dos quais três são intelectuais e sete emocionais. Deve-se notar, porém, que os atributos Divinos são perfeitos e infinitamente diferentes daqueles dos seres humanos. Portanto, quando a Torá diz que o fato de D'us ser ético (sagrado) é um motivo para os seres humanos serem éticos (sagrados), isso significa que a origem da moralidade vem do próprio D'us.


A forma perfeita, o portador do padrão para a perfeita moral – que Platão via como estando fora de D'us – na verdade se origina dentro do próprio D'us. D'us está revelando que as leis éticas que estão escritas na Torá não são apenas leis morais relativas ou análise intelectual da natureza humana que levam a adivinhações educadas sobre o que é e o que não é ético. Ao contrário, as leis éticas encontradas na Torá são uma revelação Divina daquela perfeita forma que é um paradigma para a conduta humana ética. De fato, não há uma maneira mais segura de estar certo sobre o que é ético e o que não é que o portador do padrão da conduta ética revelá-la a nós.


Então, quando confrontado pelos enormes dilemas éticos do Século 21, há apenas um local para procurar as respostas: a forma perfeita, que é a origem da ética, como está manifestada na Torá.

Por Levi Brackman

Não Seja Justo

O Livro do Gênesis (nos capítulos 13-14 e 18-19) nos relata sobre a perversa cidade de Sodoma (Sedom).

Primeiro lemos como Lot, sobrinho de Avraham, instalou-se em Sodoma apesar do fato de que seus habitantes eram "maus e pecadores para com D'us"; Sodoma é assolada pelos exércitos de Kedarlaomer, e Avraham vem para resgatar seu sobrinho capturado; encontramos então Avraham suplicando a D'us para poupar a cidade pecaminosa pelo mérito dos residentes justos que lá possam viver, mas acontece que nem ao menos dez pessoas assim podem ser encontradas; dois anjos, disfarçados de homens, visitam a cidade, mas somente Lot lhes oferece hospitalidade; Lot os salva da ralé sodomita, e eles, por sua vez, resgatam a ele e suas duas filhas antes de destruir a cidade.


Quais eram os pecados de Sodoma? Em diversos idiomas, o nome da cidade é sinônimo de perversão sexual. Isso deriva da narrativa da Torá de como a ralé que cercava a casa de Lot exigia que este entregasse seus dois hóspedes a eles "para que possamos violentá-los." Mas as tradicionais fontes judaicas - o Talmud, Midrashim e os Comentários - têm um ângulo diferente sobre a história de Sodoma. Lá, a ênfase não está em seus pecados sexuais, mas na sua falta de hospitalidade e sua violenta oposição a quem quer que ouse compartilhar qualquer bem da cidade com um estranho.


Nas palavras do Talmud: "Os homens de Sodoma foram corrompidos somente por causa do bem que D'us havia lhes prodigalizado... Disseram: 'Como a terra nos fornece o pão, e o solo tem ouro em pó, porque devemos receber viajantes, que vêm a nós somente para se aproveitar de nossa riqueza? Ora, vamos abolir a prática de alojar viandantes em nossa terra...'"


Eles até encontraram uma forma de ser caridosos enquanto se asseguravam de que nenhum estrangeiro se beneficiaria de sua caridade: "Se um pobre por acaso fosse para lá, cada morador lhe daria um dinar, sobre o qual haveria seu nome escrito, mas nenhum pão era vendido a ele. Quando morria, cada um vinha e recolhia de volta seu dinar." Chegaram ao ponto de decretar: "Aquele que der um pedaço de pão a um mendigo ou estranho será queimado numa estaca."


A história de Sodoma aparece na Torá contra o pano de fundo da vida de Avraham. De fato, Sodoma é a antítese de Avraham, retratado pela Torá como a própria personificação de chessed(benevolência). Avraham dá muito de si, tanto materialmente (fornecendo comida e alojamento aos caminhantes) quanto espiritualmente (compartilhando as verdades que descobriu, rezando por Sodoma); o sodomita pretende guardar para si mesmo aquilo que é.


O que é notável sobre os habitantes de Sodoma é que não são ladrões (como a geração do Dilúvio). Mesmo quando privavam um intruso de seus pertences, eram cuidadosos em fazê-lo de forma "legal." De fato, sua filosofia básica parece até benigna. Nas palavras de Ética dos Pais:


Aquele que diz: "O que é meu, é meu, e o que é seu é seu" - esta é a característica de Sodoma.


O que pode ser mais justo? Certo, o povo de Sodoma levou isso a extremos repulsivos. Mas todapessoa que declara: "O que é meu é meu, e o que é seu é seu" é um sodomita? Tudo que está declarando é: "Não tocarei naquilo que é seu, mas não espere que eu lhe dê alguma coisa."

Para o judeu, esta justiça é a essência do mal.

Por Yanki Tauber

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Parashá Vayerá

A Parashá Vayerá inicia-se com a incrível demonstração de bondade por Avraham (Abraão), àqueles que ele pensa serem três homens, mas que na verdade são anjos enviados por D'us, pesar de seu extremo desconforto pelo recente brit milá, circuncisão.
Os anjos entregam sua mensagem, declarando que Sara milagrosamente dará à luz a seu primeiro filho no prazo de um ano, com a idade de 90 anos (o próprio Avraham teria cem anos). Em seguida, eles seguem para a cidade de Sodoma. D'us informa a Avraham que as cidades de Sodoma e Gomorra serão destruídas por causa da perversidade, e Avraham responde com uma longa prece e dialoga com D'us pedindo pelo salvamento das cidades.
Incapaz de encontrar dez cidadãos íntegros, D'us começa a destruir as cidades, mas não antes que os anjos salvem o sobrinho de Avraham, Lot e sua família, da destruição. Acreditando que o mundo inteiro havia sido destruído, as duas filhas de Lot embebedam o pai, para que ambas possam ficar grávidas dele, e cada uma acaba tendo um filho.
Sara é raptada por Avimelech, o rei de G'rar, que não havia percebido que ela era casada. D'us reage castigando-o com uma peste, que o impede de tocá-la, e informa Avimelech que Sara é casada, quando então é imediatamente libertada.
Sara concebe e dá à Luz Yitschac (Isaac), e Avraham faz uma grande comemoração. Sara vê Ishmael (o filho de Avraham com Hagar) como uma ameaça ao bem-estar espiritual de seu próprio filho. Relutante a princípio, Avraham segue a ordem de D'us, de dar ouvidos à esposa, expulsando Ishmael e Hagar de sua casa. Com Ishmael a ponto de morrer de sede no deserto, D'us escuta seus gritos e faz com que Hagar encontre um poço de água, e com isso o jovem é salvo.
Avraham assina um pacto com Avimelech na cidade de Be'er Sheva, e vivem em paz por muitos anos. A porção da Torá conclui com a akeidá, o altar, o décimo e último teste de Avraham, no qual ele demonstra sua boa vontade em aquiescer à ordem do Criador, de oferecer seu amado filho Yitschac em sacrifício.

 Mensagem da Parashá


Você está recostado em sua poltrona, relaxado e envolvido num excelente livro, bebericando um copo de limonada gelada. Apreciando totalmente este descanso muito valorizado, é subitamente interrompido pelo som do telefone. Hesitante, pega o receptor para ouvir a voz de seu amigo, David. Ele está se mudando hoje e precisa de ajuda para carregar algumas caixas. Não desejando perturbar seu tempo de folga com nenhuma espécie de trabalho pesado, você responde quase mecanicamente que não, pois está ocupado agora. Desligando o telefone, volta à trama absorvente do livro.
A Torá, no início da porção desta semana, descreve com riqueza de detalhes como Avraham, quando visitado por três hóspedes, demonstrou enorme solicitude em servi-los e cuidar deles. Avraham "apressou-se a ir à tenda de Sara," para que ela pudesse preparar pão fresco, ele "correu até o rebanho" para preparar as melhores iguarias, e então "ficou de pé, perto deles, debaixo da árvore", enquanto comiam na sombra, assegurando-se de que cada necessidade lhes fosse fornecida (Bereshit 18:6-8).
Rabeinu Bachya destaca que, embora Avraham fosse um homem idoso e estivesse fraco por causa da circuncisão que fizera apenas três dias antes, e apesar de ter muitos servos que poderiam ter atendido os hóspedes, em sinal de respeito Avraham fez tudo sozinho, com grande zelo e entusiasmo.
Ao final da porção da Torá há uma outra situação, na qual Avraham demonstra seu caráter zeloso. Na manhã em que Avraham levantou-se para realizar a akeidá, o sacrifício, a Torá relata que "ele se levantou cedo" para cumprir a mitsvá. Nesta difícil situação, quando Avraham recebeu ordem de levar o filho amado, pelo qual esperara ansiosamente por tantos anos, como uma oferenda, poder-se-ia pensar que a última coisa que a pessoa faria fosse acordar cedo para embarcar nesta missão! Mesmo assim, vemos que Avraham o fez. Como é possível?
Uma vez mais, temos um exemplo da personificação de Avraham da qualidade de ser zeloso, rápido e entusiasta em cumprir as mitsvot, preceitos, de D'us. Avraham desenvolveu este traço a tal ponto que, mesmo nesta situação difícil e extremamente penosa, ainda foi capaz de superar o desejo natural de protelar, chegando mesmo a levantar-se cedo para fazer a vontade de D'us.
Isso nos ensina uma lição inacreditável, que justamente quando a situação é desconfortável, ainda temos a capacidade de cumprir uma mitsvá com zelo e entusiasmo, e especialmente quando a mitsvá não é tão difícil.
Há um conceito bem conhecido na dinâmica humana conhecido como inércia - tendência natural da pessoa de tentar permanecer tão inativa quanto possível. Esta tendência intensifica-se quando se trata de cumprir mitsvot, porque há um freio natural, a má inclinação, que fará todo o possível para impedir que a pessoa faça uma ação que lhe possibilitará uma recompensa no Mundo Vindouro. Com isto em mente, temos uma pergunta: Como a pessoa adquire a característica de Avraham? Como subrepuja sua indolência natural para atingir a grandeza?
Há duas maneiras de fazer isso: Rabi Moshê Chaim Luzzatto explica que podemos fazê-lo, concentrando-nos em todas as coisas que D'us realiza para nós, pois se pudermos reconhecer todo o bem que Ele nos concede, e as enormes maravilhas que realiza desde o dia em que nascemos até nossos últimos, sem dúvida nos apressaremos em fazer o possível para retribuir, com toda nossa capacidade, cumprindo a Torá e exaltando Seu nome.
A segunda maneira, diz Chafetz Chaim, é reconhecer a importância de cada minuto. Sabemos que cada palavra da Torá que a pessoa estuda é uma mitsvá por si mesma. Se a pessoa fala à velocidade normal, seriam aproximadamente duzentas palavras por minuto, portanto, se a pessoa fala sobre a Torá por um minuto, realiza duzentas mitsvot de uma só vez. Agora pense: se a pessoa estuda por quinze minutos, cumpre três mil mitsvot! Se aprender por uma hora, faz doze mil mitsvot! E se a pessoa estuda o dia inteiro? Que tal alguns dias? Todas as mitsvot vão se somando, e quanto mais mitsvot cumpre, mais recompensa recebe. Dentro de pouco tempo, terá a capacidade de cumprir milhões!
É através deste reconhecimento que adquirimos o desejo de utilizar cada momento da maneira mais completa, seja estudando Torá, ajudando o próximo. Porém, precisamos de uma presteza e zelo especiais para nos assegurar de que corremos para fazê-las, e ao mesmo tempo buscando a certeza de que são cumpridas adequadamente.
A idéia de valorizar cada momento foi explicada numa parábola por rabi Moshe Yitschac Hadarshan. Imagine se todos aqueles que estão no cemitério recebessem outra meia-hora de vida, para conseguir tanta recompensa celestial quanto lhes fosse possível. Veríamos pessoas correndo para lá e para cá, estudando Torá, visitando os doentes, rezando, consolando os enlutados e fazendo caridade, cada pessoa de acordo com sua habilidade. E se essas pessoas recebessem algumas horas de vida, ou mesmo alguns dias? Não tentariam utilizar o tempo para cumprir tantas mitsvot quanto lhes fosse possível? E quanto a nós - quem de nós sabe quanto tempo ainda lhe resta?
É bem como disse o Chafetz Chaim certa vez: "A vida é como um cartão postal. Quando iniciamos uma viagem, escrevemos em letras grandes e espalhadas. Mas quando vemos que o espaço para escrever no cartão está acabando e ainda há tanto a dizer, começamos a escrever em letras cada vez menores, espremendo as palavras onde quer que haja um cantinho."
Ocorre o mesmo com nosso cumprimento de mitsvot; não somos tão cuidadosos sobre fazer todo o possível porque achamos que há muito tempo à disposição. Mas com o passar da vida, percebemos como o tempo é escasso na verdade, e tentamos espremer tantas mitsvot quantas pudermos. Entretanto, se percebermos agora o valor do tempo, podemos utilizá-lo ao máximo de nossa capacidade.
Por isso, quando estivermos em casa, prazerosamente lendo um livro ou qualquer outra coisa que preferiríamos não interromper, devemos refletir novamente naqueles métodos de incrementar o cumprimento da mitsvá. Devemos nos lembrar como D'us é bom para nós, e o quanto devemos realizar para retribuir pelo menos uma fração disso. Devemos ter em mente a importância e valor de cada minuto e de cada mitsvá. Por fim, devemos considerar que não importa o desafio que seja o cumprimento de uma mitsvá, é um desafio maior que o foi para Avraham levar seu filho ao sacrifício?
Com este reconhecimento, que possamos merecer a realização de mais preceitos, elevando desta maneira nossa recompensa, tanto neste mundo como no Mundo Vindouro.

Judeus Sefarditas – Origem das familias Almeida e Gutierrez

A família Almeida se origina na nobreza portuguesa. O primeiro a receber o nome, e portanto o fundador da família, foi Payo Paes Guterres. O nome Almeida vem do castelo de Almeida (na região homônima.) Almeida deriva do árabe “Al Majida”, que significa morada gloriosa (referência ao castelo.) Com a conquista da terra por parte de Guterres, os portugueses adaptaram o nome, que passou a se chamar “Castelo de Almeida”. A família Almeida, portanto, tem origem na família hispânica Gutierrez. Gutierrez A família Almeida, como vimos, deriva da família Guterres, forma aportuguesada do espanhol Gutierrez. Há diversas variações gráficas para esse nome: Gutiérrez, Gutierrez, Guter, Butre, Gutier, Wittier, Gutierre, Guterre, Guterres, Gut, Goter, Gauter, Gualter, Galter, Gulter, Baltar, Boltar, Belter, Gutérriz, Guterriz, otérriz, Goterriz, Guteres, Gútrez, Gutrez, Gutérrez, Guterrez, Gottreich, Baltériz, Balteriz, Baldériz, entre outros como a forma inglesa “Goodrich”. Todos pertencentes à mesma família, cuja origem está nos judeus perseguidos pelos visigodos, povo de origem germânica que emigrou do leste europeu.

Dentre os visigodos na Espanha, havia forte presença judaica: “Em todos os eventos, os judeus estavam na Espanha juntamente com os romanos antes de 409; e cerca de um século depois, quando havia apenas um reino visigodo na Espanha, os judeus lá estavam, distribuídos ao longo do país em numerosas congregações, como antítese aos cristãos bárbaros, celebrando seus próprios Sábados, e festivais, circuncidando seus filhos, solenizando o casamento segundo o costume judaico, e observando estritamente as leis dietéticas, e até mesmo ocasionalmente convertendo escravos pagãos ao Judaísmo.” (Dr. Julius Fust, “Do Oriente”)

Com a invasão dos visigodos, os judeus foram brutalmente perseguidos, e forçados a se converterem, e a abandonarem sua fé. “Aqueles que permaneceram judeus apesar de todo o seu sofrimento [o rei dos visigodos] interditou a celebração da Páscoa, dos Sábados, e de outras festas… se tornariam escravos e perderiam suas posses…. [mas] obteriam sua liberdade caso se convertessem.” (ibid)

As famílias Gutierrez e Almeida (na realidade, a mesma família), portanto, estão entre as primeiras famílias de origem ibérica a se tornarem cripto-judias, pertendo sua identidade.

MILÊNIO E SHABAT

Rabino Nilton Bonder

O dia 31 de Dezembro deste último ano do milênio no calendário ocidental ocorre numa Sexta-feira à noite, quando começa o shabat para a tradição judaica.

Shabat é o conceito que propõe descanso ao final do ciclo semanal de produção inspirado no descanso divino no sétimo dia da Criação. Muito além de uma proposta trabalhista já conquistada em grande parte das sociedades do planeta, shabat entende a pausa como fundamental para a saúde de tudo que é vivo. A noite é pausa, o inverno é pausa, mesmo a morte é pausa. Onde não há pausa, a vida lentamente se extingue.

Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente; onde o meio-ambiente e a terra imploram por uma folga, uma pausa; onde nós mesmos não suportamos mais a falta de tempo - shabat é uma necessidade do planeta. A terra, Gaia, nós e nossas famílias precisamos da pausa que revigora. Prazer, vitalidade e criatividade dependem destas pausas que estamos negligenciando.

Hoje o tempo de "pausa" é preenchido por diversão e alienação. Lazer não é feito de descanso, mas de ocupações para não nos ocuparmos. A própria palavra "entretenimento" indica o desejo de não parar. É a busca de algo que nos distraia para que não possamos estar totalmente presentes. Estamos cansados mesmo quando descansados. E a incapacidade de parar é uma forma de depressão. O mundo está deprimido e a industria do entretenimento só pode crescer nestas condições.

Nossas cidades se parecem arquitetonicamente cada vez mais com a Disneylândia e o tipo de emoções que buscamos, também. Longas filas para aproveitar experiências pouco interativas.

Fim de um dia com gosto de vazio; um divertido que não é nem ruim nem bom. Dia pronto para ser esquecido não fossem as fotos e a memória de uma expectativa frustrada que ninguém revela para não dar o gostinho ao próximo.

Estamos entrando o milênio num mundo que é um grande shopping. A internet e a televisão não dormem. Não há mais insônia solitária; solitário é quem dorme. As bolsas de Ocidente e Oriente se revezam fazendo do ganhar e perder, das informações e dos rumores atividade incessante. A CNN inventou um tempo linear que só pode parar no fim.

Hoje não se consegue parar a não ser que seja no fim. Mas as paradas estão por toda a caminhada e por todo o processo. Sem acostamento, a vida parece fluir mais rápida e eficiente, mas ao custo fóbico de uma paisagem que passa. Os olhos não têm muito tempo para ver e recorrem à memória para recuperar o que a retina apreendera. O futuro é tão rápido que se confunde com o presente.

As montanhas estão com olheiras, os rios precisam de um bom banho, as cidades de uma cochilada, o mar de umas férias, o domingo de um feriado, a noite de penumbra e o simples de uma lipo.

Nossos artistas só sabem fazer instalações - dispor para funcionar. Nossos namorados querem "ficar", trocando o "ser" pelo "estar".

Saímos da escravidão do século XIX para o leasing do século XX - um dia seremos nossos. Do escambo por carinho e tempo, evoluímos para a compra de carinho e tempo. Quem tem tempo não é sério, quem não tem tempo é importante. Nunca fizemos tanto e realizamos tão pouco.

Nunca corremos tanto e deixamos tanto inacabado. Nunca tantos fizeram tanto por tão poucos.

Parar não é interromper. Muitas vezes continuar é uma interrupção. Mas isto nos parece difícil de entender. E assim o sol não pára de nascer e a semana de acabar. O mês passa rápido - menos que o salário - mas quando se viu o ano já passou. Do jeito que estamos, não tarda muito, o milênio já foi.

Shabat é pausa. O dia de não se trabalhar não é o dia de distrair - literalmente "tornar desatento".

É um dia de atenção, de ser atencioso consigo e com sua vida. A pergunta que se fazem as famílias no descanso -- "o que vamos fazer hoje?" -- é marcada por ansiedade. E sonhamos com uma longevidade de 120 anos quando não sabemos o que fazer numa tarde de domingo.

O tempo por não existir faz mal a quem quer controla-lo. Quem "ganha tempo", por definição perde. Quem "mata tempo", se fere mortalmente. E este é o grande "radical livre" que envelhece nossa alegria - o sonho de fazer do tempo uma mercadoria, um artigo.

Em tempos de milênio temos que resgatar coisas que são milenares. A pausa é que traz a surpresa e não o que vem depois. A pausa é que dá sentido à caminhada.

A prática espiritual deste milênio será viver as pausas. Não haverá maior sábio do que aquele que souber quando algo terminou e quando algo vai começar. Afinal, por que mesmo que o Criador descansou? Talvez porque mais difícil do que iniciar um processo do nada, seja dá-lo como concluído.